quarta-feira, 1 de junho de 2011

O BALÉ DE FLAVIO SAMPAIO(REVISTA TRIP)


Com 6 anos de idade, sem nunca ter visto TV nem sequer a foto de um bailarino em ação, Flávio se lembra de ensaiar movimentos de balé nas areias da praia da Bica.
No início dos anos 70, Flávio perseguia, sem muito êxito, seu objetivo principal, dançar balé. A chance apareceu em janeiro de 1974, num curso especial que o diretor do Municipal do Rio de Janeiro, Dennis Grey, fora convidado a dar em Fortaleza, e Flávio fazia como ouvinte. Acompanhou meses de curso incógnito, até um dia, quando chegou mais cedo, encontrou a porta do teatro aberta e o palco, lá no fundo, iluminado. Ninguém por perto, nada além de uma bela música. Subiu no palco e executou tudo que aprendera observando. O teatro, porém, não estava totalmente vazio, o próprio professor observava tudo do escuro. Grey se aproximou de um lívido e envergonhado futuro parceiro e disse apenas: “Venha amanhã que você vai aprender”. 


Daí em diante sua carreira teve ascensão meteórica. Apesar de ter entrado oficialmente no curso com seis meses de atraso em relação aos colegas, Flávio terminou a formação no ano seguinte como melhor aluno da turma, sem experiência anterior em balé. O prêmio foi um mês de workshops no Municipal do Rio. No ano seguinte, trabalhou na Cia. do Teatro Guaíra, de Curitiba, até uma noite fria de sábado de 1976, em São Paulo, onde o grupo encerrava uma turnê. No fim do espetáculo, a maioria dos colegas rumou para a rodoviária e, de lá, para o Rio de Janeiro: no domingo haveria prova para o corpo de balé do Teatro Municipal. Flávio Sampaio tinha decidido não fazê-la. Apesar do rápido sucesso, era consciente de que havia começado tarde na dança, a concorrência era fortíssima, enfim, o esforço não valia a pena. Uma amiga o convenceu do contrário e ele embarcou durante a madrugada para a capital fluminense. 
O corpo de balé do Municipal não se renovava havia 15 anos, a quantidade de bailarinos experientes concorrendo era imensa. Entre os únicos três aprovados estavam Ana Botafogo e um cearense de Paracuru.
 


A crueldade da própria arte ele experimentou num ensaio quando já era o terceiro bailarino do Municipal do Rio. Levantou uma colega que se desequilibrou no alto e o atirou de costas ao chão. Por lá ficou. Uma hérnia de disco gravíssima o obrigou a ficar de cama por meses, sem se mexer. Após cirurgias e muita fisioterapia, tentou um retorno, frustrado por dores incessantes. Com a impossibilidade de fazer o que mais gostava, no auge da vida profissional, Flávio resolveu arriscar: prestou a prova para mestre de balé do Municipal, algo que muitos consideravam inviável. “É coisa para os 50, 60 anos”, reconhece. Aos 39, tornou-se professor de balé clássico da melhor escola do país. Novamente, porém, entrou em confronto com a tradição. “Me disseram que os alunos não me respeitariam, por ser muito jovem. A primeira vez que lecionei balé clássico foi na Europa, em Munique, a convite de uma amiga. Depois fui para Varsóvia, um dos centros mais importantes do mundo, porque é totalmente vinculado à escola russa, a melhor.” Só depois da experiência no exterior é que Flávio Sampaio foi autorizado a dar aula no Municipal do Rio, onde trabalhou até se aposentar, em 1999.



ESCOLA SIM, ONG NÃO 
 Os jovens que bateram à porta de Flávio, anos atrás, hoje são dançarinos profissionais da Companhia de Dança de Paracuru e professores dos novos alunos. Recebem R$ 200 por mês. Desde janeiro de 2008, esse dinheiro tem saído da aposentadoria de Flávio Sampaio. “Nós perdemos a renovação do patrocínio por falhas na entrega do projeto. Eu não podia deixar os monitores sem salário. Um deles vai ser pai, logo.” Enquanto a renovação não sai, Sampaio mantém toda a estrutura por conta própria, assim como no início de tudo, quase dez anos atrás. “Não sinto que estou fazendo um projeto social”, faz questão de afirmar. “Sou obrigado a fazer as vezes de um, mas, essencialmente, sou um professor de balé. É engraçado, as pessoas da cidade comentavam que eu estaria armando minha candidatura, porque vendi um apartamento para construir essa casa onde estamos hoje. Ainda é algo que persiste na mentalidade daqui: quem faz alguma coisa coletiva está sempre esperando um retorno político ou econômico.”

 Lucas, aluno do terceiro ano de balé, passou dois meses sem ir às aulas. O pai proibiu, pois os amigos mangavam dele: “O moleque lá era boiola para dançar balé?”. Depois de muita insistência do próprio garoto e de uma conversa com o professor, o pai deixou o filho retornar. Flávio não se ilude: “Eu não tenho a pretensão de achar que nosso trabalho tem o poder de fazer esses pais, que são pescadores, agricultores, perderem o preconceito, algo arraigado neles. Eu acho que num lugar tão carente nossa escola é uma ponte para novas oportunidades. Os pais ouvem coisas positivas daqui, vêem crianças com auto-estima elevada, a cidade as elogia pela educação. E os meninos, então? São os maiores namoradores, dançam como ninguém nos forrós de sábado, têm um porte que os outros não têm. Ter a segurança de que seu filho terá mais perspectivas na vida supera qualquer preconceito”. 

FONTE: REVISTA TRIP




"Quando fui atrás de informações sobre Flavio Sampaio não encontrei muita coisa que viesse a ser digna desse grandioso mestre do balé brasileiro. Até que me deparei com esse artigo da revista TRIP que achei perfeito." G A


"O Ballet Clássico é uma arte das mais difíceis, requer inteligência, paciência, bom humor, persistência e observação. Acredito que o papel do professor é fundamental, não só parte técnica como também na emocional. É muito mais fácil dançar quando o professor transmite confiança, alegria, bom humor e paciência ao aluno. Este livro é essencial a todas as pessoas que fazem dança, principalmente fora das grandes capitais, onde a informação é quase nenhuma". Nora Esteves


BALLET ESSENCIAL
Editora: Sprint
Categoria: Artes / Dança

´A paixão pelo Ceará me levou a organizar este livro. Costumo dizer que comecei a despertar a desejo de conhecê-lo mais intimamente ainda criança, ao ouvir uma história contada pelo meu avô paterno sobre uma viagem a pé do Sítio Lima à cidade do Aracati, no Vale do Jaguaribe. A minha cearensidade foi-se construindo lentamente em uma época a partir deste momento. Os antigos caminhos, os patrimônios históricos, as ocupações dos lugares e os costumes emolduraram histórias que chegaram a mim através das narrativas e me fizeram conhecer um passado ainda muito presente nos tempos que atravessam a nossa indentidade. Os textos a seguir surgerem um passeio pelas trilhas da nossa gênese e pelos arquétipos da alma cearense´.

CEARÁ DE CORPO E ALMA

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